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28/01/2014

Pedaços de mim

Daqui, de longe, posso vê-lo sentado debaixo do grande carvalho, com os cabelos voando ao sabor do vento. Ele agora está sempre sozinho. Antes costumávamos ser um só naquela árvore. Agora que se foi, somente posso senti-lo quando releio meus diários. Ou, então, revejo antigas fotos salvas no meu computador. Infelizmente, todos são registros de um alguém, que ainda estou tentando entender. 

Vejo filmes apaixonados. Leio romances. Vivo comendo soverte até doerem os dentes. Meu índice glicêmico anda pedindo socorro. Paro. Daí eu corro atrás de adrenalina. Mas não passa. Não. Vira e mexe estou remoendo aquele adeus. Por que ele se foi? Será que a culpa é minha? Às vezes dou uns tapas na cara. Mas lá escuto, outra vez, uma misteriosa voz atormentando meus pensamentos.

"Sofre-que-passa", alguns já disseram.

Aos doutores de plantão, garanto que essa tática tem lá seus efeitos colaterais. Já tentei. E estou absurdamente perdida num espaço de tempo, que já deveria ter virado passado. Só vejo uma luz, no final do túnel, que nunca chega. Gostaria mesmo de poder colocar a cabeça no travesseiro e não sentir mais um tiquinho desse falecido sentimento. Mas um morto-vivo ainda habita mim.

"Dá-a-volta-por-cima", alguém até sugeriu.

Certa noite resolvi, finalmente, tirar o cartão da bolsa. Disquei o número rabiscado e, no segundo toque, escutei uma voz do outro lado. “Aceito”, eu disse. Coloquei batom vermelho. Arrisquei um salto alto com um vestido justo. Senti um frio na barriga antes de sair de casa. Saí batendo a porta e não olhei para trás.

A agradável noite devolveu minha autoestima. Mas isso não bastava. Ainda faltava meu senso de humor, minha inteligência, meu cinismo, minha raiva e todas as minhas impressões digitais, que continuavam espalhadas em algum lugar.

"Una-os-pedaços", pensei alto, quando já estava sozinha novamente.

Claro! Como não pensei nisso antes? Resolvi parar de nadar contra a maré, ou me deixar levar pela correnteza. Mergulhar, agora, me parecia mais sensato. Afinal, é necessário encontrar pequenos pedaços de mim nesse mar aberto dentro do meu peito. Pedaços que, em algum dado momento, eu imaginei ter perdido. Mas que, hoje, eu tenho a certeza de que eles estão, aqui, em algum lugar. 

Ops! Acabei de encontrar alguma coisa: paz.

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